domingo, 28 de março de 2010

Pedro Juan Gutiérrez

Deixo aqui duas traduções que fiz de poemas de Gutiérrez. Os textos, encontrei-os publicados na revista mexicana Blanco Móvil, de Eduardo Mosches. Esse número do qual tirei os dois textos não há no site, me parece, mas não afirmo, porque a revista, da qual tenho uma versão impressa, encontra-se agora em caixas de mudança. Não lembro como era a capa. Deixo o link: http://www.blancomovil.com/home.html.


Material antipoético



O panorama deste verão é desolador
abundam as baratas
as moscas e guasasas* da merda
o fedor do lixo podre
e do esgoto derramado nas ruas
os ratos pequenos / dizem
que também há ratazanas enormes
Há avisos / vacina grátis
contra leptospirose
No Malecón um edifício se inclinou
como a Torre de Pisa
e a gente saiu fugida
Agora uns homens o derrubam
com muito cuidado / pedra por pedra
Porque pode desabar e enterrar os vizinhos
Enfim o panorama é pavoroso
sob o sol e o calor
A cidade antipoética
Nicanor Parra teria que visitá-la
Gente cansada e de mau humor Bêbados
sentados nas calçadas esperando o nada
E os poetas em baixa

Não há nada belo que cantar
uma desgraça para os poetas
Tudo é merda
Assim é impossível escrever poesia nutritiva
poesia alimentícia
poesia que faça exclamar
as damas sensíveis
oh, que grande poeta estupendo é um clássico!
Não / nada disso
A vida antipoética ganha terreno
e estabelece cabeças de praia
em cada coraçãozinho que consegue alcançar
E eu desgraçadamente
não posso olhar sozinho o mar
O mar salvador azul
O eterno belíssimo brilhante mar.

*Em Cuba, mosca pequena que vive em enxames em lugares úmidos e escuros.




Na Boca do lobo


Alguns dos meus melhores amigos
os mais honrados e honestos
se suicidaram
não resistiram à avalanche
Algumas de minhas mulheres
as mais doces e suaves
agora são ácidas e corrosivas
Estou na boca do lobo
e não sei o que fazer
Tento ganhar tempo
Será o instinto de sobrevivência
O fantasma de Kaváfis
Os influxos da lua
Escuto os cantos gregorianos
no crepúsculo
com um copo de run na mão
e um cigarro / e observo o mar
O asco e a merda se dissolvem
na luz dourada
E minha mulher / que limpa a casa
alienada de tudo
me diz não bebas sozinho
me prepara uma dose
põe limão e mel de abelha


Trad. Paulo Sandrini

sexta-feira, 19 de março de 2010

Trecho de uma carta da artista brasileira Lygia Clark a Mondrian

“Mondrian: você acreditou no homem. Você fez mais: num sonho utópico, estupendo, pensou em eras vindas em que a própria vida “construída” seria uma realidade plástica...

Talvez isto te salvasse da tua própria solidão. Pois eu, meu amigo, não sonho porque não acredito. Não por excesso de realismo mas para mim o coletivo só existe na razão desta desordem de ordem prática e social. Se o homem não pode sentir como é importante esse desenvolvimento interior - chamemos de uma forma que nasce com a pessoa como um punho fechado, talvez se abrindo no primeiro tempo com o próprio nascimento - então ele jamais poderá atingir sua plenitude como a rosa que se abre dentro do seu próprio tempo e morre amorosamente realizada, inteligente e feliz...

Mondrian, um segredo eu vou te contar: às vezes, eu me sinto tão desesperada, porque no momento em que “checo” este problema a solidão, o frio, “o medo do medo” me envolvem com todos os seus braços e procuram fechar este novo tempo que desabrocha na minha forma interior, amassando pétalas frescas e delicadas que levarão novo tempo para se abrirem como se abre um olho devagar, depois de ter levado um bom murro."

quarta-feira, 10 de março de 2010

Impressões Pan-americanas

Eu e Ricardo Corona, durante a performance Jolifanto, na abertura do Impressões Pan-americanas. Acima, Ram Devineni, editor da Rattapallax de Nova Iorque, num dos encontros mais marcantes do Impressões.